quinta-feira, 7 de agosto de 2008

O assassinato da palavra


Afonso Vieira

Houve um tempo, não muito distante, que a palavra de um homem valia mais que qualquer documento escrito, ao menos foi com esses valores que cresci, fui educado e presenciei diversas situações durante minha curta existência.
Tenho certeza que muitos já ouviram o bordão “dou minha palavra”. Sim, uma pessoa honrada, quando assume um compromisso, cumpre! Com o esfacelamento atual de nossas instituições no quesito moral, acredito que a situação tende a se agravar ainda mais.
Já presenciei até mesmo cenas de violência, onde os envolvidos estavam a defender suas afirmações. Particularmente, ao ser acusado de uma falsidade, iria até as últimas conseqüências em busca da realidade.
Institucionalizou-se a mentira: ministros de Estado, autoridades nos mais variados cargos e até mesmo nossa recente história é deturpada. Nossas Leis protegem os falsos, dando-lhes o direito de permanecer calado, mesmo com inúmeras evidências de seus descalabros. Nem mesmo documentos assinados, com exames grafológicos atestando sua veracidade valem – falta óleo de peroba para tanta desfaçatez!
No convívio diário, não é raro o descumprimento de tratados orais. Quantas vezes já deixamos de comparecer a eventos marcados, em que assumimos claramente a presença? Distorcer o que foi dito é comum. Não temos nem o cuidado de comunicar - seja por telefone, correio eletrônico ou correspondência postal - nossa falta.
A preocupação chegou a tal ponto, que boa parte das organizações não mais aceitam apenas documentos escritos, há a necessidade de reconhecimento em cartório.
As pessoas tendem a induzir os demais ao comportamento errôneo, solicitando que participem de suas mentiras, acobertando seus atos. Muitos fogem da responsabilidade, delegando a “maçã podre” a terceiros, ou ainda, simplesmente ignorando a outra parte, como se somente isso solucionasse o problema. Não enxergam que só adiam o inevitável.
Posso estar sendo um tanto quanto conservador, ou mesmo tradicionalista. Mas o fato é que corrói ver que estamos tendo que criar um excesso de normas, leis e padrões de conduta - que seriam totalmente dispensáveis-, pelo simples fato de que ninguém mais dá valor à palavra. Ao menos tenho certeza e coloco a cabeça tranqüilamente no travesseiro, ciente que minha parte tenho feito. Isso é mera questão de respeito com o indivíduo que, ao mentir para outrem, está automaticamente enganado a si próprio.
Iludem-se os filhos, amigos e cônjuges. Autoridades mentem visando galgar postos em suas carreiras, políticos já aboliram a boa-fé de seus dicionários.
Eu ainda fico com o norte-americano Henry David Thoreau: "antes que amor, que dinheiro, que fama, conceda-me a verdade”.
Tragicamente, poucos, muito poucos ainda honram a palavra. Ceticamente falando, creio que faço parte de uma raça em extinção.

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