quarta-feira, 22 de outubro de 2008

O papel da imprensa


Afonso Vieira

Estamos acompanhando mais um acontecimento trágico que ganhou os holofotes da mídia nacional. O seqüestro que culminou no ferimento de uma garota e morte de outra, e o seqüestrador – ex-namorado da falecida – foi preso. E a imprensa fazendo o circo com milhares de especialistas surgidos de última hora; os urubus dos programas sensacionalistas e até mesmo os jornais de maior credibilidade, não falam em outra coisa.

Os últimos casos de tamanha repercussão nacional foram outras tragédias com crianças, o caso do menino João Hélio e da garota Isabela Nardoni. A exposição midiática chegava a sufocar, não se ouvia outra coisa nos programas televisivos e veículos impressos. Em detrimento da qualidade, busca-se audiência a qualquer preço.

De imediato já trataram de arrumar um bode expiatório para o ocorrido, o GATE, grupo de elite da polícia paulista - reconhecido até mesmo no exterior - com um percentual de acerto acima da média. Somente este ano, em 18 ações realizadas, 47 pessoas foram salvas – são números repassados pelo jornalista Reinaldo Azevedo. Assim como ampla maioria de quem acompanhou o caso, acredito que houve erros por parte da polícia, mas afirmo com convicção, eles são os mais preparados no país para lidar com casos dessa natureza!

Até hoje tento entender qual o problema da imprensa com os homens da Lei, pois independente do desfecho dos casos, sempre são culpados de alguma forma. Tive o desprazer de ler que “todos nos acostumamos a ver com certo receio”, uma referência à polícia, exatamente isso, tem jornalista dizendo que não devemos confiar nos PMs. Façam o seguinte, no próximo seqüestro, confiem no bandido e poupem os cofres públicos de gastos desnecessários em segurança e aparato policial. Quem não gosta de polícia é marginal!

Quem tem que apurar os fatos, neste caso, são os órgãos competentes e pessoas investidas para esse poder. Não meia dúzia de palpiteiros e oportunistas de plantão.

Em contrapartida, trataram de canonizar as garotas, vítimas do meliante. Na falta de pauta ou algo melhor, esmiúçam as vidas das adolescentes à exaustão. Sou cético e tenho mania de contestar antes de tomar juízo. O culpado pela tragédia é o marginal, única e exclusivamente! Mas como é que uma garota começa um relacionamento amoroso com 12 anos de idade e sob a complacência dos pais? Os valores de nossa sociedade precisam ser revistos.

Não assisto esses programecos que fazem de tudo por meio ponto no ibope, mas li que a cobertura enquanto do seqüestro, foi outro show de horror. Como é que entrevistam - ao vivo - um bandido, dando-lhe ar de celebridade? Isso é ético? Isso não atrapalha/atrapalhou o trabalho da polícia?

Infelizmente, em um país cheio de problemas, com polícias mal pagas, educação capenga e famílias desestruturadas, qualquer circo de horror é vendido – e quanto pior, melhor. A mídia precisa rever seus conceitos, pois é a primeira a reclamar ao menor sinal de regulamentação. A ética jornalística tem se resumido a audiência, custe o que custar. Perdem a qualidade, o bom senso e a vergonha na cara.

domingo, 19 de outubro de 2008

Palpiteiros


Afonso Vieira

É impressionante a quantidade de “especialistas” que aparecem nas ocasiões de crise ou situações trágicas. O ardor por criticar e dar opinião sobre o que pouco ou nada dominam, é maior do que a própria razão ou busca pela verdade. Nem se dão ao trabalho de pesquisar ou aguardar maiores informações sobre o que propõem a debater.

A tragédia do seqüestro paulista é “a bola da vez”. Pululam textos e conversas sobre o despreparo da polícia; oras, convenhamos, se o GATE - referência até mesmo internacional em situações desse tipo - não é o melhor indicado para a ocasião, quem seria? Houve erro, sim, houve, mas já adianto, qualquer que fosse o desfecho do imbróglio, a polícia seria alvo de críticas. Se matassem o meliante e salvassem as garotas ilesas, os grupos de direitos humanos já estariam soltando seu veneno pela mídia nacional. Situações extremas não têm manual padrão, cada caso é ímpar. Alguém tem que tomar decisões, isso faz parte do gerenciamento de crises. Ninguém em sã consciência desejaria a morte das reféns, ninguém do lado da Lei! Só nos resta aguardar a apuração dos fatos por quem de direito.

Na confusão entre as polícias do estado de São Paulo, outro festival de baboseiras em blogs e jornais. Era previsível que oportunistas de sindicatos e políticos apareceriam para incitar a violência; de outro lado, há a autoridade e a Lei a ser preservada, lembrando que existe norma específica proibindo manifestações naquele local. José Serra é conhecido por sua arrogância e destempero, mas a Polícia Civil tem a incumbência legal de preservar a Lei e a ordem. O presidenciável vai ter que descascar esse abacaxi, os salários são pífios e ultrajantes para o maior Estado da Federação.

Sobre a crise financeira global, continuam as estultices sobre o fim do neoliberalismo. A maior parte dos críticos nunca deve ter lido nada de economia ou estudado como funcionam os governos ditos liberais. O que eles criticam, não passa de uma utopia que chamamos de anarco-capitalismo, que nunca existiu! Milton Friedman defendia, muitas vezes, a ausência total de regulação, mas na prática nunca aplicou isso, nem mesmo em sua passagem pelo Chile. Esses mesmos biltres ignoram que o mundo atual está em melhores condições, justamente devido ao capitalismo de mercado, que entre seus tropeços, proporcionou a significativa melhora na qualidade de vida global. Se especuladores erraram por falta de regulamentação, que se corrija o gargalo, proponham-se medidas saneadoras.

Na próxima situação de crise, dispensem os policiais, não se embasem por teorias econômicas e políticas; procurem os doutores em “achismo”, ou aquele blogueiro, pseudo-jornalista sem diploma, professores de história. Não se esqueçam da vizinha fofoqueira, ou daquele palpiteiro de internet que sempre sabe de tudo, mas nunca leu um livro com embasamento teórico sobre o tema que deseja discutir. Tenho certeza que os profissionais de segurança, políticos e das equipes econômicas ficarão extremamente satisfeitos com o desenrolar dos fatos . . .
Publicado em O Jornal do Vale, 22.10.2008

terça-feira, 14 de outubro de 2008

O valor de um livro


Afonso Vieira

Recebi, na semana passada - de presente – um exemplar do novo livro do jornalista Reinaldo Azevedo, O Pais dos Petralhas. Para minha surpresa, veio autografado pelo próprio autor. Recordei-me do natal de 2005, quando ganhei de uma grande amiga, O Príncipe e Quando Nietzche chorou, o primeiro a obra-prima de Maquiavel comentada por Napoleão Bonaparte, o segundo um best seller que não me agradou muito. Mas o valor do volume se tornou imensurável, devido às dedicatórias neles contidas.

Sou do tipo saudosista, que compra um livro para guardá-lo, se ganho, seu valor é ainda maior. Normalmente escolho a dedo o que busco, clássicos filosóficos ou que falem sobre política e economia. Poucos os romances me atraem, destaco o escritor peruano Mario Vargas Llosa, autor do excelente Travessuras da menina má. Lendo Cartas a um jovem escritor - que tive a felicidade de encontrar o exemplar intacto no sebo de um amigo na Benedito Calixto, em São Paulo – abri ainda mais minha visão sobre o mundo da literatura. Mais uma obra para que eu guarde pela eternidade.

Pois é, tenho lido muito menos do que deveria, e muito mais que a maioria. Temos ótimas opções de leitura, das mais variadas. Encontramos praticamente todos os clássicos em versão gratuita na internet, os chamados e-books. Se formos analisar, temos que estimular a leitura, se não for em forma de livro que se faça na forma de jornais e revistas, sempre há algo de produtivo e interessante a se extrair.

Meu pai sempre estimulou o hábito da leitura, tínhamos uma ampla biblioteca em nossa casa, com todos os grandes títulos da literatura infantil e universal, eu cheguei a ler todos repetidas vezes. Também li - quando criança – O pequeno príncipe; quem não se recorda do Menino do dedo verde? Ou da obra de José Lins do Rego, Menino de Engenho? Tive esses trabalhos em minha posse, no percurso da vida fui perdendo, alguns ainda devem estar na chácara da família, na velha estante da sala.

Hoje, o hábito e as obras são outras, com outra ótica, mas quem não gostaria de ter um exemplar de Nietzche na sala? Costumo dizer que temos que ler o contraditório de nossos pensamentos para embasar melhor nossa opinião, neste ponto entra O Capital, de Karl Marx. Ainda irei comprar alguns que já li, mas por necessidade do ego, quero possuir: Freakonomics, A riqueza das nações, Capitalismo e liberdade, todos os livros do Llosa, enfim, são muitos, pretendo consolidar uma ótima biblioteca pessoal. Meu atual sonho de consumo é a obra de Raymond Aron, O ópio dos intelectuais, que na sondagem breve que fiz pelo google, é um investimento alto dentro de minhas prioridades atuais.

O conteúdo de um volume literário, muitas vezes, torna-se secundário devido ao valor emocional agregado. Sempre há algo de ensinamento, nem que seja somente a linguagem de Camões. Voltando ao título que originou esta crônica, ainda que discorde de várias coisas que escreva Tio Rei, vejo a qualidade de seu texto como algo ímpar no jornalismo nacional, os primeiros artigos são excelentes. E pode ter certeza, devido ao gesto de quem me presenteou, a obra vai para um lugar de destaque em meu acervo pessoal. Quem sabe um dia atinjo a estatura intelectual a ponto de escrever um livro, meras divagações de um aspirante a escritor.

http://www.campogrande.news.com.br/canais/debates/view.php?id=4166

Publicado em O Jornal do Vale, 17.10.2008


quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Liberais


Afonso Vieira

Estamos vivendo uma das maiores crises financeiras de nossa história. Não bastasse a tragédia anunciada já há certo tempo, ainda somos obrigados a ler e ouvir ilações infundadas sobre os pilares do liberalismo econômico; um pouco de cultura e história sobre o assunto não faria mal a ninguém.

Cabe ressaltar que o liberalismo clássico com sua mão invisível - pregado por Adam Smith - perdeu força já no fim do século IXX - com o surgimento dos oligopólios/monopólios - diminuindo ou mesmo sepultando a concorrência nos mais variados setores.

Os governantes Ronald Reagan e Margareth Thatcher foram os grandes expoentes - no fim do último século - como defensores do livre mercado; porém, nenhum deles aboliu meios de controle estatais. Eu gostaria que algum crítico que vocifera contra a livre concorrência, mostrasse em qual Estado inexiste o poder regulador pelo ente público, qual país - tido como liberal - não possui agências reguladoras ou órgãos equivalentes?

Cabe ainda outra questão: se Fernando Henrique Cardoso - auto-proclamado de esquerda - quando criou o Proer para ajudar os bancos em estado de falência era chamado de neoliberal, porque a intervenção norte-americana é sinônimo de sepultamento do mesmo? Há incoerência nos discursos, ou é somente sanha por criticar qualquer que seja o governo que discorde? Lula já disse que não é de esquerda, mas para os louros da fama seus asseclas fingem que ele nunca professou tais palavras.

Noto um rancor tremendo, ou um oportunismo barato nas apreciações. Chamar FHC de “direita” é tão ridículo como dizer que Médici era de esquerda. Mais um pouco de história para embasar melhor o tema: nossos militares eram estatólotras, cerceavam a liberdade, concentravam o mercado e detinham controle de monopólios; seriam eles defensores do liberalismo? É claro que não!

Os conceitos oriundos dos Girondinos e Jacobinos ganharam novas feições, não cabem mais as simplórias definições. Hoje falamos em diversas vertentes - conservadores, liberais, libertários, socialistas, comunistas - todos com pontos de vista particulares; alguns até corroboram com outros em alguns temas, mas divergem totalmente em outros.

A crise do subprime, ao que tudo indica, surgiu de uma má regulação. Mas o que fazer em situação extrema? Alguém acha injusto o governo - que cobra considerável parcela todos os dias em impostos - socorrer o mercado? Oras, se não servisse para situações como esta, então serve para quê?

Não confundam defensores do Estado mínimo com anarco-capitalistas; as escolas de Chicago e Austríaca tinham seus pontos de utopia, porém, sabiam perfeitamente que não há mercado sem governo. O socorro ao sistema ainda não surtiu o efeito desejado, mas as crises servem para o aprendizado e para enxergar gargalos existentes. Perdem investidores, perdem ideólogos utópicos, aprimoramos nossos conhecimentos. Mas pedimos encarecidamente: informem-se sobre o que desejam escrever. Nós, liberais, agradecemos!
Publicado em O Jornal do Vale, 11 de outubro de 2008